Leitura de Manoel de Barros
Na pa
lavra,
absolvição dos vermes
redenção das folhagens
cumplicidade da terra
animais
homens
Flor escrachada
que se celebra
contra o almanaque das raízes
promessa de sementes
sondagens no aluvião
Subversão espontânea
de todas as entranhas
secreto fluido
na origem de tudo.
Verbo sem desleixo
apregoando edital das coisas
bichos
seres
(interlocução com a natureza)
A curva do rio,
vértice do poema
na vertigem do asfalto
promessa de sementes
eis a palavra a palavra a palavra
a palavra se germina
e gesticula nos purgatórios
e se instala, voci-
ferando
campo de chama e prazer
e
o poema o poema o poema
narciso redivivo,
o poema se cumpre inaudível
mas soberano
como os cetáceos nos pélagos do mar.
E se impõe e se instala
entre avencas retesadas
na sintaxe do barro
no fonema da areia
miliardário destino
solidário
como o seio da mulher
metáfora das maçãs
quais casulos soberanos
memórias das árvores
devaneio de luas e girassóis
(e)terna a gramática
que se expõe no chão estrelado
segredando outras lições
no latifúndio das frutas
ou no riacho que se vinga
no espetáculo do trajeto
de tugúrio em busca do mar.
(Do livro “Canção dentro da noite”, Ed. Thesaurus, DF, 1998)
Ronaldo Cagiano
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