13 de dezembro de 2011

ESCOMBROS DE PRÉDIOS DERRUBADOS VIRAM LIXEIRA DE DOCUMENTOS HISTÓRICOS

Mauro Sérgio Fernandes

    Simplesmente patético. Patético e desolador. Então o prédio da redação do "Cataguases"  foi demolido...Ao tomar conhecimento dessa notícia, veio-me à lembrança o outro prédio situado na rua Coronel Vieira, onde, na década de 50, ficava a reação do "órgão oficial dos poderes municipais" e onde eu passava horas e horas de minha mocidade. Entrava pelo portãozinho do lado, dobrava a direita logo em seguida e entrava naquele salão antigo, onde o Butão, o Mário e o Alzir Arruda conversavam sobre a próxima edição, geralmente discutindo, discordando e até mesmo se estranhando.
A cena era semanal, quase sempre a mesma,  e o velho Alzir, com o cigarro no canto da boca, saía pisando duro, esbravejando alto e xingando entre dentes (e, às vezes estridente). Butão me saudava, relembrando os tempos do escotismo em Cataguases, quando eu, ainda com quatro aninhos, desfilava garbosamente como mascote dos escoteiros, na frente da bateria, sob o comando do chefe, o sempre tranquilo Cabo Hélio.
Depois, vinha o Mário. Conhecido como Mário da Redação, ele me exibia a prova gráfica de minha crônica para eu fazer a revisão final. Não muito raramente, eu me encontrava com Manuel das Neves, exímio cronista considerado o "Rubem Braga cataguasense". Para mim, ele era também o Dr. Manuel, Diretor do Colégio de Cataguases. Melhor que qualquer Academia,  redação de jornal do interior tem algo de sacralidade, da dimensão de um "templo do saber e da cultura".
Agora, em nome do progresso vão derrubar um prédio também antigo. Coisa velha e  antiga não se sustenta em cabeças insensatas, ainda que essa "coisa velha, antiga" tenha o sentido histórico e o sentimento de eternidade. Pior ainda : nos escombros foram enterrados documentos, preciosidades históricas do século XIX, nos quais foram registrados atos e fatos da história política, cultural e social de nossa Princesa da Mata.
Pra quem possui um mínimo de sensibilidade, isso dói. E doendo, gera indignação.
Pois bem, senhores donos do Poder. Comprem o prédio do Cine Edgard. Continuem na mesma insensibilidade de não terem preservado a Casa da Rua Alferes.
Derrubem tudo, arrasem tudo, destruam tudo.. Pisem nos maltrapilhos que dormem sob as marquises. Arranquem as flores dos jardins, apaguem todas as luzes, ressequem todas as fontes, apodreçam todos os frutos, sequem o Rio Pomba, rasguem com talhos de gilete e navalha todas as telas e murais. Decretem o fim do carnaval e de todos os festejos populares, queimem todos os livros, condenem à forca todos os escritores, pintores, músicos e artistas. Tomem de assalto todos os palanques, todos os sindicatos e emudeçam as rádios e todos os veículos de comunicação. Assaltem os Bancos, transportem todas as cédulas de reais e todas as moedas de centavos para a banheira de suas casas e vão tomar banho, o banho mais mefistofélico de todos os tempos. Banhem-se nessa banheira sem água, fedendo como o vil metal, porque vocês também  irão feder.     Fedam-se.    Fodam-se.
 
Mauro Sérgio Fernandes 

Cataguasense hoje radicado em Brasília, 
um dos maiores intelectuais da história
cataguasense,  foi professor de português 
de muitos jovens por aqui, que se tornaram
talentosos escritores.