20 de abril de 2009

Cena do moço viajante

*Francisco Inácio Peixoto
- Não se avéxe seu moço, se apeie
E entre pra dentro de casa
Nem que seja pra um dedo de prosa...
Se descance do bruto estirão
Que o sol está quente de morte!
Se apeie seu moço, quê isso!
Não custa esperar um tiquinho...
Vou agora lá dentro e já volto,
Dar ordem de trazer pro senhor
Um cuité d'agua fresca da talha.
E o moço seguindo viajem
Se despediu contente do homem
Mais da filha dêle tambem
E estalando com a lingua saíu
Pensando -nem é bom de pensar!
Que gôsto dágua teria
Aquéla agua da mina gostosa
Si fosse bebida na concha
Das duas mãos tão cheirosas
- Mais limpas muito mais frescas
Que um cuité bem raspado -
Daquéla virgem formosa...

*Francisco Inácio Peixoto
Cataguases - MG
(05.04.1909 - 08.01.1986)

Sem caixão, por favor

*José Antonio Pereira

Nasci de cabeça para baixo
brotando de humano ventre.

Permitam-me o caminho contrário.

Nada de brancos linhos
nem negras mortalhas.
Não me encaixotem.

Enterrem-me de pé e nu.

Deixem que a mãe Terra
reabrigue seu feto
em teu morno ventre.

*José Antonio Pereira (Cataguases – MG)

Poema imposible


*Cláudio Sesín

Al final de la fiesta, lo inminente.
No fim da festa,o iminente.
La luna empequeñece lo pensado.
A lua faz pequeno o imaginado.
Hay ausentes cruzando la penumbra
Há ausentes que cruzam a penumbra
y huellas del amor y destinos perdidos.
marcas do amor e destinos perdidos.
Hay ausentes sin alma y nadie que reclame
Há ausentes sem alma e ninguém que reclame
cuánto tiene la murte de abandono.
o quanto tem a morte de abandono.
!Alegrarime, madre, madrecita!
Alegrarime, mamãe, mamãezinha!
!Cómo van a alegrarse corazones
Como pode alegrar-se um coração
si el aguardiente es fuego entristecido!
se a aguardente é fogo entristecido!

*Claudio Sesín (San Fernando Catamarca ARG)
Tradução de Anderson Braga Horta

Ser a tempo e hora

*Emerson Teixeira

Tempo dentro de outro tempo

Viver essa procura insana
Onde estou mais pronto?
Onde me encontro?
Mas, vivo, até que ponto?

Ser a tempo e hora.

Se me procuro
vivo ou morro?


Onde em mim?

Manhã, quem em mim desperto?
Noite, quem em mim adormeço?


Do espelho só imagem
eu quem somos?


Quem dos olhos me olho?


*Emerson Teixeira Cardoso (Cataguases – MG)

Guerras de imperio


*Eduardo Dalter

El objetivo en las guerras
posmodernas,
acaso entre las más bárbaras
que la historia
reconozca, son los barrios,
los mercados,
las bibliotecas y la gente
sencilla
de la calle. Se vio en
Irak
trizada y martirizada,
con sus centenares
de miles de muertos
y sus escombros
aún calientes. Y se ve en
la Franja
de Gaza, donde el objetivo,
a decir
por las cifras de la sangre
y de la muerte,
fueron los niños, por sobre
todo,
las escuelas ya de polvo
y las familias,
en camino al abismo, o al
baldío
del mundo, que los bárbaros
han venido
tejiendo en cerco y fuego
hasta hoy.

*Eduardo Dalter (Buenos Aires – ARG)

Os últimos dias de março


*Eric Ponty

Dá-nos alento ao perceber
que em alguma parte do mundo
devem existir pessoas corretas
pela honra e civilidade abrolhada
um jovem ou rapaz que nunca leu
Rilke ou desconheça-se deste lirismo:

Que acredite liberdade ser possível,
liberdade não: por ser em muitos lugares,
não tenha única verdade, esta sua,
do princípio adquirido pelos humanos,

O rapaz está ali de pé entre as flores,
resmunga-nos em sua juventude,
pronuncia-se à vista deste mundo,
sonha em seu sonho um sonho frágil,
não o conflito da Palestina ou Botsuana,
ou qualquer outro denominado medo
onde este céu verteu-se em morte;
onde as flores inclinam-se ao direito
perfumes, texturas azuis, manhãs alvas:

Que acredite ser o dom natural seu,
de médico, poeta, artesão, ascensorista,
porque é dele este sonho icario;
não meu por não mais ter vago sonho,
pela honra e civilidade embotada
acredite existir pessoas virtuosas,
um jovem ou rapaz que nunca leu
Rilke ou desconheça-me no lirismo.
*Eric Ponty ( São João del Rey –MG)

Maria Lavadeira

*Francisco Inácio Peixoto

Maria Lavadeira
Da beira do córgo
Estende roupa no varal
Bate roupa na pedra
Lava roupa dia inteiro
Sem descançar...

Ah! vida escomungada...
um diluvio de filhos remelentos
O marido levado da bréca
A casa toda escorada,
Com a imagem suja
De Nossa Senhora do Perpétuo Socorro
Pregada do lado de fóra da porta...

Bemdita Nossa Senhora
Que não deixa a casa da gente cair!

Antigamente Maria Lavadeira
Inda passava o tempo melhor.
Veiu a danada da bexiga
Estragou com éla
Não dando mais gôsto pros outros
De enganar o marido déla...

Ah! Maria Lavadeira
Assunga a sáia
Atóla os pés no berro preto
Da beira do córgo
Estende roupa no varal
Bate roupa na pedra
Lava roupa dia inteiro
Semana inteira
Sem descançar
Sinão teu marido
Te xinga te bate
Te bate no lombo...



*Francisco Inácio Peixoto
Cataguases - MG
(05.04.1909 - 08.01.1986)

9 de abril de 2009

Poêma

*Francisco Inácio Peixoto
Você menina de-já-hoje passou
Um mundo de vezes na minha rua,
Se lembra direito?

Você menina passou
Olhando desejosa pra um lado, pra outro
Assim como quem quer...
Querendo o quê?

Diz que você te mesmo mania...
Não tem sofrimento de viver em casa:
Fica na rua...
Fazendo o quê?

Si você soubesse
Que delicias gosadas eu calcúlo
Ezistirem em você...
Sabe não?

Quando você chegou na esquina
E se deu na vontade
De cocertar sua meia,
Me viu na janéla
Ou se esqueceu que meua avós
Eram tupinambás?
Se esqueceu?

*Francisco Inácio Peixoto
Cataguases - MG
(05.04.1909 - 08.01.1986)

8 de abril de 2009

Meia - Pataca

*Francisco Inácio Peixoto
De primeiro o lugar se chamava
Arraial do Meia-Pataca
Por causa de terem achado
Num córguinho que por aqui passava
Meia-pataca de ouro.

Tambem nunca acharam mais nada...

Imagino Cataguazes
O que seria de você hoje
Si em vez só de meia-pataca
Tivesse mais ouro naquêle córguinho...

do livro Meia Pataca(1928)


*Francisco Inácio Peixoto (05.04. 1909 – 08.01.1986)
Autor de Meia Pataca, com Guilhermino César - Dona
Flor, Passaporte proibido, A janela Chamada geral e Erótica

05 de abril de 1909 - Cem anos de Chico Peixoto

Francisco Inácio Peixoto nasceu em Cataguases no dia 05 de abril de 1909.
Escreveu e publicou Meia Pataca (poesia) com Guilhermino César em 1928, Dona Flor (conto) 1940, A Janela (conto) Passaporte proibido (romance e novela) 1960, Erótica (poesia) 1981, Chamada geral ( conto) 1982; traduziu o romance Oblomov, do russo Ivan Alexandrovitch Gontcharov 1966. Seu nome está intimamente ligado à arte e à arquitetura moderna na pequena Cataguases. Foi um dos integrantes do Grupo Verde, de poetas modernistas e um dos mais importantes articulistas da Revista Verde, uma das principais revistas modernistas da década de 20 em Minas Gerais.
Em 1940 contrata Oscar Niemeyer para projetar sua residência e em 1945 o Colégio Cataguases. Participaram destes projetos o paisagista Burle Marx, Joaquim Tenreiro com o mobiliário. No Colégio, também participou Candido Portinari com o painel “Tiradentes”. A partir daí diversos outros edifícios modernos são construídos na cidade.