2 de maio de 2008

Pela noite - Zeca Junqueira

Inspirado no poema
Fuga sobre a morte,
de Paul Celan
Por que a poesia de Paul Celan
não faiscou nas cinzas dele que desistia,
conduzindo-o assim para fora, das
cinzas ao carvão,
aquecendo-o até torná-lo brasa e fogueira,
por que a insurreta poesia não incendiou a noite de Celan
onde persistiam a tocar os escuros violinos e
branqueou o leite-breu que continuava a enojá-lo,
por que a palavra que vinha pela noite e queria brilhar
não ateou fogo na casa do homem que chamava os mastins, e
o tisnou, e aos seus cães, e ao campo todo
por que o levante da poesia não se deu e
não encheu a cova funda cavada no chão de Celan e
não esmagou a cabeça das serpentes da morte de olhos azuis
que o perseguiam, e
não o libertou, e não o livrou do veneno e do suicídio,
por que a poesia de Celan não o elevou das cinzas ao incêndio,
por que a poesia de Celan enredou-se no silêncio e entregou-o
enganada à cova grande nas nuvens onde não se deita ruim
- e onde em tempos já de paz (não para ele) Celan aceitou deitar
enquanto permaneciam tocando cada vez mais escuro em sua
alma os malditos violinos?
Zeca Junqueira

Nenhum comentário: