8 de agosto de 2011

Em “Os olhos vesgos de Maquiavel” Fernando Cesário usa o homem para homenagear a mulher


Marcelo Lopes*
“Cristine me fascinava especialmente por algo nos olhos. (...) Mas havia qualquer coisa de extraordinário no modo como me espreitava”.(Os olhos vesgos de Maquiavel)
Lolita, do escritor russo Vladimir Nabokov, um dos romances mais polêmicos da literatura, conta a paixão de um homem muito mais velho por sua enteada adolescente, linda, sensual e audaciosa. O escritor cataguasense Fernando Cesário está lançando seu mais novo romance, Olhos vesgos de Maquiavel, em que um professor de meia idade, se apaixona por uma de suas alunas adolescente, linda, sensual e audaciosa. As semelhanças entre as duas obras, no entanto, terminam por aí. A moça em questão tem tambémmuito de Capitu, a personagem de Machado de Assis em Dom Casmurro. Apesar de ser contada por um homem, nesta história ele é apenas coadjuvante, porque tudo gira e acontece em torno desta estudante, motivo que o  levou a compartilhar conosco esta sua experiência afetiva. Ao fim e ao cabo, podemos dizer que o livro é, sem dúvida, uma sensível homenagem à mulher.
Em Olhos vesgos de Maquiavel Fernando Cesário apresenta-nosVicente, que narra com a quase precisão de um diário, seu envolvimento com uma moça muito jovem, Cristine, quetem atitudes e reações próprias de quem já adquiriu experiência e maturidade. O autor expõe em detalhes os conflitos interiores do narrador e suas limitações, mostrando em contrapartida e subliminarmente, o poder que a mulher exerce nas relações amorosas.“Já trazia consigo a pimenta de uma mulher (...) Aos poucos, no entanto, se abeirava de volta a menina...” Cristine não é apenas forte e segura de seus atos. Ela é a síntese do que representa hoje a mulher em um relacionamento afetivo. “...ela, inalterada e plácida, não parecia se preocupar mi­nimamente, revelando extraordinário poder sobre suas emoções e impulsos”. É esta personalidade forte, distinta que nos faz crer que Cristine seja metade Lolita, metade Capitu. A primeira, mais volúpia e prazer, e a segunda, mais racional e estrategista, condições indispensáveis para compensar sua pouca idade e tomar as rédeas da situação.
Estamos, certamente, diante da melhor obra de Fernando Cesário, que anteriormente nos brindou com o premiado“Alma de Violino” e que agora posso dizer, sem medo de errar, era o prenúncio do que estava por vir com este excelente“Olhos vesgos de Maquiavel”. Um livro enxuto, denso, e que oferece uma leitura prazerosa nos impulsionando a seguir adiante nas memórias de Vicente sobre seus sentimentos por Cristine, além de revelar suas fraquezas, medos, certezas e tudo o mais que envolve paixões avassaladoras. “O invisível é o ensaio do medo, o invisível”. E se todos nós um dia, vivenciamos uma paixão, ler este romance permite voltar os olhos para as nossas lembranças e, involuntariamente, nos vemos em determinadas situações narradase,inconscientes,acabamos por fazeruma catarse de nós mesmos. Para quem acompanha a obra de Cesário, “Olhos vesgos de Maquiavel” não apenas confirma o grande escritor que é, como também pode ser considerado um divisor de águas em sua literatura, cada vez mais íntima, precisa e singela.
*Marcelo Lopes é jornalista e historiador.

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